O silêncio que sabota: como a cultura do silêncio impacta seu potencial
![O silêncio que sabota: como a cultura do silêncio impacta seu potencial](assets/cultura-do-silencio/cultura-do-silencio.jpg)
O Impacto do silêncio nas organizações
Em um dos capítulos de A Organização Sem Medo, Amy Edmondson destaca como a falta de segurança psicológica em ambientes de trabalho pode gerar consequências graves, não apenas para o desempenho organizacional, mas também para a saúde física e mental das pessoas.
Quando o ambiente não é propício e propício para expressão, as pessoas podem ficar ansiosas, frustradas e questionarem a segurança do lugar.
Sentir que não se pode falar
A autora utiliza como exemplo o desastre do ônibus espacial Columbia, ocorrido em 2003, quando todos os sete astronautas a bordo morreram.
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Antes do acidente, o engenheiro da NASA, Rodney Rocha, identificou uma possível falha ao assistir imagens do lançamento.
Ele percebeu que um pedaço de espuma isolante poderia ter danificado a asa da nave, mas suas tentativas de alertar superiores e solicitar imagens por satélite foram desencorajadas.
Sentindo-se sem autoridade para questionar decisões ou insistir, Rocha permaneceu em silêncio durante uma reunião crucial.
Posteriormente, uma investigação concluiu que o dano causado pela espuma foi o fator determinante do acidente e que havia alternativas, embora difíceis, que poderiam ter salvado os astronautas.
Edmondson ressalta que o caso de Rocha exemplifica como a cultura de silêncio nas organizações pode impedir que problemas sejam abordados, mesmo em situações de risco crítico.
O engenheiro não disse que escolheu ficar calado, mas afirmou que sentiu que "não podia falar", destacando o impacto da hierarquia e da falta de segurança psicológica na disposição para se manifestar.
A falta de comunicação aberta e a hesitação em questionar decisões no momento crítico exemplificam como a ausência de segurança psicológica pode ter consequências fatais e como o silêncio pode nos sabotar.
O que é cultura do silêncio
Amy Edmonson define a cultura do silêncio da seguinte maneira:
Uma cultura de silêncio pode, portanto, ser entendida como uma cultura na qual os ventos predominantes favorecem a conformidade em vez da expressão de preocupações. Ela se baseia na suposição de que as vozes da maioria das pessoas não têm valor e, portanto, não serão valorizadas.
A cultura do silêncio descrita acima é uma barreira da comunicação aberta, pois desestimula a expressão de ideias e preocupações, criando obstáculos para a colaboração genuína.
Quando as vozes são subestimadas, os indivíduos se retraem, o que limita o compartilhamento de perspectivas e reduz a inovação.
Além disso, essa dinâmica sufoca o crescimento pessoal, ao desvalorizar contribuições que poderiam gerar aprendizado e desenvolvimento, tanto individual quanto coletivo.
Cultura de Cassandra
![Imagem da profetisa Cassandra.](assets/cultura-do-silencio/cassandra.jpg)
Edmondson explora como ambientes com baixa segurança psicológica podem criar não apenas uma cultura de silêncio, mas também uma "cultura de Cassandra", na qual aqueles que se manifestam com avisos ou previsões desagradáveis são ignorados, ou desacreditados, em outras palavras, trata-se de “um ambiente em que falar é menosprezado e os avisos são ignorados.”
A autora utiliza a figura mítica de Cassandra, amaldiçoada a prever o futuro sem que ninguém acreditasse nela, como uma metáfora para o que acontece em organizações que desvalorizam a comunicação aberta.
Esta dinâmica é exemplificada pela escritora com o desastre do ônibus espacial Challenger, em 1986. Roger Boisjoly, engenheiro da Morton-Thiokol, alertou na véspera do lançamento que as baixas temperaturas poderiam comprometer os anéis de vedação (O-rings) da nave.
Embora seus dados fossem incompletos e sua argumentação não totalmente clara, o problema poderia ter sido resolvido com análises simples, caso os gestores tivessem ouvido suas preocupações com seriedade.
O caso destaca que, para que o ato de falar seja eficaz, é essencial uma cultura de escuta atenta e respeitosa.
Como o silêncio impacta o seu potencial
O silêncio e o medo de se expressar podem limitar a inovação, o crescimento pessoal e o potencial das pessoas colaboradoras de várias maneiras. Vejamos alguns de seus impactos:
Impedimento à solução de problemas
Quando as pessoas hesitam em falar, ideias e preocupações importantes não são compartilhadas.
Isso pode levar a decisões mal-informadas ou até mesmo desastrosas, como demonstrado nos casos da NASA.
A falta de vozes diversificadas impede a identificação de riscos e a exploração de soluções criativas.
Desvalorização de perspectivas
Em uma "cultura de Cassandra", em que as preocupações são ignoradas ou menosprezadas, os colaboradores podem sentir que suas contribuições não são valorizadas. Isso desmotiva o engajamento e a iniciativa, reduzindo a capacidade coletiva de inovar.
Inibição do crescimento pessoal
O medo de se expressar impede que os indivíduos desafiem a si, façam perguntas ou busquem feedback.
Esse bloqueio freia o desenvolvimento de habilidades de comunicação, pensamento crítico e resiliência, fundamentais para o crescimento pessoal e profissional.
Falta de motivação e engajamento
Quando as pessoas sentem que não podem contribuir ou que suas ideias não serão ouvidas, elas tendem a se distanciar emocionalmente do trabalho, afetando o desempenho individual e coletivo.
Disfunções no time e o silêncio
![Cinco pessoas reunidas ao redor de uma mesa.](assets/cultura-do-silencio/pessoas-reunidas.jpg)
Esteja a cultura do silêncio ou a cultura de Cassandra presente, desenvolve-se facilmente uma disfunção no time, o que podemos inferir com base na explicação de Amy.
Para entendermos um pouco melhor o cenário que se cria e impacta o desenvolvimento do potencial de cada pessoa colaboradora, vamos entender a proposta de Patrick Lencioni, que em seu livro The Five Dysfunctions of a Team, descreve cinco disfunções que prejudicam a eficácia e o desempenho de um time. Vejamos cada uma delas:
Ausência de confiança
A primeira disfunção descrita por Lencioni é a ausência de confiança. Sua causa seria a falta de vulnerabilidade entre os membros do time, sendo que seu impacto é perceptível quando as pessoas têm medo de admitir erros, pedir ajuda ou compartilhar fraquezas, a base para a confiança não é construída, prejudicando a colaboração genuína.
Medo do conflito
O medo do conflito é a segunda disfunção indicada pelo autor. A ausência de confiança leva a evitar conflitos abertos e saudáveis, assim, em vez de debates honestos e construtivos, surgem discussões veladas e comentários evasivos, limitando a exploração de ideias e soluções inovadoras.
Falta de comprometimento
A falta de comprometimento indica a ausência de discussões claras e debates significativos, as pessoas time não se sentem realmente envolvidas nas decisões.
Pelo contrário, elas podem fingir concordância em reuniões, mas raramente se comprometem de verdade com os planos e objetivos definidos.
Evitar responsabilidade
A falta de comprometimento com objetivos claros dificulta que as pessoas se responsabilizem, o que leva à quarta disfunção: evitar a responsabilização.
Neste cenário pode-se construir um ambiente no qual comportamentos inadequados ou desempenho insatisfatório não são corrigidos, prejudicando o progresso do time.
Desatenção aos detalhes
Por fim, a última disfunção é a desatenção aos detalhes. Quando não há responsabilização, as prioridades individuais – ego, carreira ou reconhecimento – podem se sobrepor às metas coletivas.
O time perde o foco nos objetivos organizacionais, comprometendo os resultados gerais.
A cultura de silêncio descrita por Amy Edmondson e as cinco disfunções de um time propostas por Patrick Lencioni estão profundamente interligadas, pois ambas revelam como a falta de comunicação aberta e confiança pode limitar o desempenho e o potencial tanto das pessoas colaboradoras quanto da organização.
Estratégias para comunicação aberta
Uma estratégia eficaz para criar um ambiente com comunicação aberta e superar as disfunções de um time envolve implementar cinco pilares opostos às disfunções, conforme descritos por Patrick Lencioni:
1. Construir confiança
- Incentive a vulnerabilidade, onde as pessoas possam compartilhar suas falhas, preocupações e dúvidas sem medo de julgamento.
- Realize atividades de construção de equipe e promova conversas honestas para aprofundar os laços interpessoais.
2. Conflitos saudáveis
- Crie um ambiente onde as pessoas possam debater respeitosamente, sabendo que conflitos não são pessoais, mas voltados para o crescimento e soluções melhores.
- Reforce que discordar faz parte do processo criativo e leva a decisões mais bem informadas.
3. Decisões e planos
- Garanta que todos na equipe tenham oportunidade de expressar suas opiniões antes de decisão ser tomada.
- Explique os motivos por trás das decisões para que todas as pessoas compreendam o propósito e apoiem os planos de ação.
4. Promover a responsabilização
- Estabelecer expectativas claras e métricas de sucesso para cada pessoa.
- Criar uma cultura onde os colegas se sintam confortáveis em dar feedbacks construtivos e cobrar mutualmente.
5. Foco em resultados coletivos
- Ter objetivos individuais alinhados aos objetivos organizacionais.
- Celebrar conquistas coletivas para reforçar o trabalho em equipe.
Benefícios de falar abertamente
Mas quais seriam os benefícios de uma cultura em que o silêncio não prospera, mas sim a confiança e a possibilidade de falar abertamente?
Em seu livro “Dare to Lead”, Brené Brown destaca que ao encorajar conversas difíceis, as lideranças promovem uma cultura que rejeita o silêncio e o julgamento, abrindo espaço para empatia e a colaboração.
Essa abordagem é essencial para criar ambientes de trabalho onde a vulnerabilidade e a coragem conduzem à inovação, à conexão humana e ao trabalho significativo. Ainda podemos destacar outros pontos em que falar abertamente pode trazer benefícios às organizações.
Aumento de engajamento
Ambientes que valorizam a comunicação honesta criam conexões emocionais que podem aumentar o engajamento e a satisfação dos colaboradores.
Dessa forma, encorajando um ambiente seguro psicologicamente o estresse é reduzido e há uma melhora no bem-estar, tornando a organização um lugar onde as pessoas desejam trabalhar.
Melhora no desempenho organizacional
O enfrentamento de conversas difíceis ajuda a criar culturas resilientes e colaborativas que promovem a excelência, uma vez que organizações onde as pessoas se sentem ouvidas tendem a ser mais ágeis, adaptáveis e eficazes.
Prevenção de erros
O diálogo franco ajuda a abordar problemas complexos e resolver conflitos, fortalecendo o trabalho em equipe, levando, portanto, a ambientes seguros, os quais incentivam as pessoas a reportarem problemas e falhas rapidamente, evitando que pequenos erros se transformem em crises maiores.
Conclusão
Identificar a existência de uma cultura de silêncio é essencial para promover ambientes de trabalho saudáveis, colaborativos e inovadores.
Quando o medo de se expressar ou a falta de confiança impede que indivíduos compartilhem suas ideias, dúvidas ou preocupações, não apenas o potencial do time é comprometido, mas também o crescimento individual.
Há aquelas que sentem que suas vozes não são ouvidas e tendem a se retrair, perdem a motivação e não exploram plenamente suas habilidades e talentos.
Romper esse ciclo silencioso é uma oportunidade de empoderar indivíduos, cultivar o aprendizado contínuo e criar equipes que prosperem com base na transparência e na confiança mútua.
Para saber mais sobre segurança psicológica confira nossa Formação! Além de aprender como criar uma cultura de confiança, você terá contato com outras estratégias para superar uma cultura do silêncio.
Veja também:
- Curso “Confiança: crie uma cultura baseada em confiança”
- Curso “Comunicação participativa: liderança eficaz e motivadora"
- Artigo “Segurança psicológica: o que é e sua relevância no trabalho”
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Brown, Brené (2018). Dare to Lead: Brave Work. Tough Conversations. Whole Hearts. Random House.
Edmondson, Amy C. (2018). The Fearless Organization: Creating Psychological Safety in the Workplace for Learning, Innovation, and Growth. Wiley.
Lencioni, Patrick (2002). The Five Dysfunctions of a Team: A Leadership Fable. Jossey-Bass.